A Alta Via dei Monti Liguri: bikepacking na Itália

19/07/2024

Por Fernando Cintra

A Alta Via dei Monti Liguri – ou em português o Caminho Alto dos Montes Lígures – é um percurso de bikepacking na Ligúria, região do norte da Itália onde se encontram pontos como Cinque Terre e a cidade portuária de Gênova.

Em meio às abundantes montanhas, florestas e culinária incrível da região, percorri a Alta Via dei Monti Liguri (ou apenas “AV” para os íntimos) nas duas primeiras semanas de agosto de 2019.

Se você está procurando uma rota de Bikepacking repleta de singletracks, muita oportunidade de acampamento selvagem e com relevo absolutamente desafiador, prepare-se: ao terminar esse post você vai querer comprar sua passagem para a Itália amanhã.

O post está dividido em duas partes. Na primeira vou falar de aspectos técnicos para que você possa percorrer a rota. Na segunda vou contar um pouco de minha visão enquanto cicloturista e pessoa.

Resumo da Alta Via Dei Monti Liguri:

  • Distância: 500km
  • Fora de asfalto: 400km
  • Ponto mais Alto: 2.300m
  • Ganho de elevação: 20.000m
  • Singletracks: Bastante, aproximadamente uns 100km
  • Acampamento: É possível acampar selvagem quase todas as noites
  • Dias: 15
  • Tempo pedalado: 60%
  • Bicicleta: Mountain Bike rígida
  • Época para percorrer: de Maio a Outubro
  • Dificuldade (1-10):  9

O percurso e GPX

A Alta Via dei Monti Liguri é uma rota de bikepacking que cruza toda a região italiana da Liguria. Ela sai da cidade de La Spezia e chega na cidade de Ventimiglia. Como o próprio nome indica, ela não passa pela costa, mas sim pelos montes.

A Alta Via está quase toda sinalizada com as letras AV (Alta Via), seja pintado em troncos de árvores ou

O percurso é absolutamente desafiador, e especialmente por dois motivos. O primeiro é o ganho de elevação. São mais de 20 mil metros de ganho de elevação, com subidas intermináveis todos os dias.

O segundo é o terreno. Há estradas de terra lisas como um asfalto, mas também trilhas tão técnicas que a velocidade para descer muitas vezes é menor que para subir. Não há um dia sequer (dos 15 necessários para concluir a rota) em que o cicloturista não vai empurrar a bicicleta. Vários dias, inclusive, haverá trechos onde é necessário carregar a bicicleta nas costas.

O cicloturista, no entanto, é recompensado com trechos intermináveis de estradas de terra que passam por densas florestas, picos com vistas de cair o queixo e trilhas super divertidas e bem conservadas.

É possível dividir também o percurso da Alta Via dei Monti Liguri em três. O primeiro, da cidade de La Spezia até Santa Maria dal Taro, é o mais árido e quente, com vistas encantadoras do Mediterrâneo a todo tempo.

vista da costa ligure com escarpas e mar azul

O segundo é de Santa Maria dal Taro até um pouco depois da autoestrada de Gênova, onde a paisagem muda muito, se passa a percorrer densas florestas de pinheiros e trilhas.

Fernando Cintra pedalando em trilha meio de pinheiros com mountain bike rockrider na liguria

O terceiro é o trecho pós Gênova até Ventimiglia, onde já se começa a entrar em território alpino. A elevação aumenta muito e se percorre subidas (e descidas) contínuas e intermináveis. Aqui se pedala alguns quilômetros dentro do território francês e o ponto culminante da viagem, a 2300m.

fernanando cintra com bicicleta rockrider xc500 nos alpes ligures

Acomodação / acampamento

Há os chamados Rifugi na Italia (e em boa parte da Europa), acomodações mais simples para aventureiros e montanhistas. São alternativas baratas aos hotéis e Airbnbs. Muitos não possuem internet. Se paga até um preço diferenciado caso você use os lençóis do lugar ou seu próprio saco de dormir.

Para quem está fazendo bikepacking e quer um pouco mais de aventura pode, no entanto,  fazer como eu. A primeira forma de acomodação escolhida por mim foi o acampamento selvagem. As regras para acampamento selvagem na Italia variam demais e há uma grande confusão sobre o assunto.

acampamento selvagem na floresta na liguria durante bikepacking

Alguns parques nacionais permitem acampamento por uma noite acima dos 900m de altitude, dado que o aventureiro arme a barraca após as 17h e saia antes das 9h. Outros, no entanto, não permitem o acampamento.

Na prática, eu encontrei possibilidade de acampar todas as noites. Algumas vezes bastava pedir para alguém com um gramado visível se poderia acampar alí e logo ganhava meu terreno para montar a barraca.

Meu sistema de dormir consistia em:

  • Barraca Forclaz Ultralight 1p da Decathlon
  • Saco de dormir Ferrino conforto 0ºC
  • Travesseiro e isolante da Decathlon que não sei especificar.

Lembre-se sempre de deixar tudo como encontrou. #LeaveNoTrace

Clima

A Ligúria é uma região montanhosa e costeira. O clima é predominantemente úmido e quente no verão e muitas vezes muda do nada várias vezes ao dia.

Venha preparado para acampar com sol, receber chuva no meio da noite e acordar com uma neblina pesada que dura até às últimas horas da manhã.

Como dito acima, a melhor época para vir é de Junho até Outubro. Junho ainda há risco de alguns lugares mais altos – principalmente da última etapa da viagem – ainda estar coberto de neve. No começo de outubro o clima já é bem mais frio e há o risco de neve novamente.

Fiz a rota do dia 30 de Julho ao dia 13 de Agosto e achei perfeito o momento que escolhi. No único dia que choveu mesmo eu programei um dia de descanso na cidade de Sassello (o único da viagem, por sinal).

Bagagem

Venha o mais leve possível na Alta Via dei Monti Liguri. Traga apenas o essencial e esteja preparado para carregar a bike por bastante tempo.

Para se ter ideia, depois dessa viagem de bikepacking, eu adotei o esquema “cold soaking” em minhas refeições. Ou seja, não levo mais fogareiro, gás, cafeteira e essas parafernalhas. Como tudo frio. O que precisa ser hidratado – como cogumelos desidratados, facilmente encontrados aqui – eu deixo na água com um temperinho enquanto preparo meu acampamento.

Eu sou a favor da mentalidade “peque pelo excesso”. Leve coisas que você acha que vai usar mas que, caso não use, sejam descartáveis. É melhor levar e poder deixar no caminho que sentir falta daquilo no percurso. E vale dizer que eu deixei muita coisa. Livro, lampião, botijão, entre outras coisas.

A respeito da roupa, esteja preparado para dias de 35ºC, noites de 5ºC e chuvas espontâneas.

Bicicleta e bolsas

mountain bike rockrider xc500 com bolsas de bikepacking ortlieb em estrada de terra na liguria

Fui com uma Rockrider XC 500 da Decathlon.

A Alta Via demanda uma boa mountain bike. Ponto final. Venha com uma gravel ou algo que não seja uma MTB e a rota de bikepacking vai cobrar um preço altíssimo.

As bolsas utilizadas foram:

  • Bolsa de guidão Ortlieb L
  • Bolsa de selim Ortlieb L
  • Bolsa de cockpit Ortlieb
  • Bolsa de quadro Ortlieb S
  • Bolsa no toptube da Decathlon (não sei o modelo)
  • Mochila de 20l Quechua
  • Bolsa para câmera da própria Canon presa em cima da bolsa de guidão (como se fosse uma auxiliar)

Reabastecimento e água

Há água em abundância na Alta Via dei Monti Liguri. Na Itália boa parte das vilas possui uma espécie de fonte com água potável na praça central. Há também nos parques inúmeros pontos de água, riachos e nascentes que o cicloturista pode recolher. Leve uma capacidade de 2 litros de água e já estará tudo bem.

Em diversos dias você terá que sair da rota para poder encontrar supermercados e bicicletarias.

Há também que ressaltar que vários lugares da Itália tem horários comerciais bem mais restritos que no Brasil. Quase todas as vilas terão as portas de tudo fechado entre 12h30 e 16h00. Domingo e segunda feira e sábado a tarde são períodos em que muitos comércios também estão fechados.

Portanto planeje seus suprimentos e pontos de reabastecimento no mapa com bastante antecipadamente e com a devida organização.

Fotos e perspectiva

Foram duas semanas mágicas de bikepacking na Ligúria. Aprendi muita coisa sobre bikepacking, acampamento selvagem, comportamento em trilhas técnicas com bicicleta carregada e, por tabela, o idioma Italiano.

Estar imerso a florestas densas boa parte do dia, passar por vilas pequeniníssimas, provar da maravilhosa culinária da região, ter desafios físicos muito maiores do que imaginava. Tudo isso me ensinou demais e me fez apreciar ainda mais o ciclismo como forma de exploração e aventura.

Você encontra todas as melhores fotos da viagem no meu Instagram, entre os dia 30 de Julho e 12 de Agosto do ano de 2019


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